O corte de vida
Quando você corta o corpo, o resto morre
Ouvindo a conversa dos outros eu me perco em palavras e me encosto perto do foço e da força que vejo na cidade. Tenho que acompanhar a batida e lidar com a despedida de uma noite meio aflita junto a uma dor que dói por dentro. Tá bom, tenho que começar por sentidos e mais que possuído por lembranças e déjà vus que só por si se fazem em um tom, como um som que treme paredes e ferve canecas me deixando bege e me deixando cru.
Uma batida ainda me faz lembrar e me congela perto de um luar. Como posso tão cedo chegar e já ter alcançado os poços e os altares em uma curta vida e mais curta que o meu pequeno mar. Detidos por lobos eu me encontrei ameaçado pelo moço que com uma única palavra me arrancou do peito a certeza que carregava e genialmente assim pensava. Era certo meu caminhar.
Tinha que ser no agora, tinha que ser com esse pesar que carrego nas costas, com essa dor junto ao meu andar. Mas cortado ainda me vejo e nisso se é dividido o meu pensar. São dois lados da mesma moeda ou são dois primos de uma mesma Isabela. Parado ou deitado me encontro no mar, preso em oceanos mais soltos que a existência de todo um ar.
O tempo parou e no céu fui me encontrar. Agora eu posso lhe falar que foram lindos e belos o tempo perdido e os momentos que esteve a voar. O céu era gigante e vazio, nada mais livre que a beleza das asas que ganhei, dos segundos que perdi e das nuvens que apalpei. A cor que vejo agora é a cor mais quente e sussurra uma canção. Me balança em movimento, me fazendo enfim chegar ao chão.
Mesmo assim o momento não durou e ao passar dos minutos o meu corpo então mudou. Se me declinei, cedi ou me entreguei. Se estou contente ou se no último estágio de fim da linha me encontrei... Volto a dar a volta por cima para entrar e não me ofender com velhas feridas. Minha cama não tem seda, tem um pano e nenhum desdem que me revolta a esperança, que me desmonta a estação e que me faz tremer porque sei que tudo meu contém.
Amanhã irei acordar e ao tempo irei rogar. Sim Saturno estava certo e uma doença tenho a evitar. Se nos seus vinte e oitos anos seus pedaços ele me corta será com dons que o reconstrói, que o aflora e só por si o refaz. Parado o faço voltar ao que perdeu e ao que nutriu por tempo onde a morte era um fim ao que se teve, se sentiu e ao que de longe partiu. Com nada eu acabo com o tudo que comecei. Não mais puro e cru e agora com uma cor que me traduz. É o vermelho maior que um grito. São todas as cores maiores que qualquer bem. E desta vez não importa se a luz está acesa ou apagada. Tudo o que vai restar vai ser o corte que a vida me fez.
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