Vai surgir um bom título




 começou por tomar os pés pelas mãos e a pisar, pisar e pisar com tamanha brutalidade que as árvores, em sua grande sensibilidade para com a dor, deixavam suas folhas caírem. E (eu) continuava a pisar... Reduzindo tudo ao pó estraçalhado, passando pela avenida maquiada com rosas, doces, dores e pedaços de gelo.


º

"Sou um pedaço, moído, esfiapado, esmigalhado
Que a gente pisa no chão...
- Se algum dia tu fôres num caminho
E sentires sob teus pés
Um bagaço moído, esfiapado, esmigalhado...
Pisa de leve, sim?
Pode ser meu coração..."
(José Mauro de Vasconcelos, 1971, p. 97)



DIALÉTICA
Vinicius de Moraes

É claro que a vida é boa 
E a alegria, a única indizível emoção 
É claro que te acho linda 
Em ti bendigo o amor das coisas simples 
É claro que te amo 
E tenho tudo para ser feliz 

Mas acontece que eu sou triste…




Nem mais uma folha faz sentido nessa trilha. 
Posso andar várias vezes pelo mesmo lugar, 
sentindo diferentes vibrações, 
lembrando cada momento,
mas o único sempre
terá um vazio.



Talvez conversando contigo

(Entram em cena o entusiasmo, o desanimo e a paixão unificados em somente uma pessoa)
- Não irei subir em cima dessa mesa e nem deitar aí e ficar esperando você aparecer. 
- Começarei por aqui mesmo. E faço isso cantando, chorando ou sofrendo por pingos de amor.
- Vou me espantar com qualquer coisa que eu levantar.
- Não vou ser coeso e nem harmonioso. 
- E até o final já vou ter esquecido o que sou, o que vim fazer aqui e até mesmo o seu nome.
- Talvez eu queira voltar. Posso me forçar a lembrar... Mas, vai ser aquela mesma coisa.
- Ou você me oferece tudo ou eu não fico com nada. É um sim e não que estão bem distantes de qualquer feição.

- (caí em vertigem e volta a um passado estressado) Chega! Não vou gritar o seu nome e esperar que jogue a chave pela janela ou que me ligue no telefone.
- Não, não precisa ficar me esperando na porta. Guarde o seu tempo para usar em outra coisa que lhe traga boas memórias. (saí em direção a janela) Agora fechamos e dizemos: boa noite!?
...
- Frases soltas e sem sentido marcarão nossas vidas. 
- Pois me limitei até que não restasse mais nada.
...
- Já pensou em me ver e ter que esquecer tudo o que já aconteceu com você? Pois saiba que o fim do drama se dá no começo da ação. E nela eu derramei todo o meu coração.
- Nada do que eu disse tem um real sentido e é tudo uma ilusão.
- Mas é bom que pelo menos ao final você esteja comigo. Que me abrace forte e diga que não há mais perigo.
- Como foi bom ser teu amigo. Hoje eu só encontro você na saudade que sinto.
- E é duro dizer tudo isso. Sei que cada gota da chuva é mais um amor invisível.
- Até que eu deixe de sentir, tudo existirá para mim. A dor, o amor e todo prazer possesso e espinhento como uma flor.


sculptur
(Mário Cravo, 2003, pg. 98)

ENVOLVO, PEGO, SEGURO E CORRO
trago levo troco tiro
balanço, falo enquanto firo,
olho, cheiro, toco, mordo
sinto a cor o corpo a forma
e danço, acaricio e corto
penetro, arranco boto e miro
e suo, e suo… e resfolego
e ando…
vejo!... olho meto e viro
esfrego, lixo e acaricio
choro….
renasce o corpo e alma

no espaço giro e de novo piro

 




Mais verde que o verde,
só mais um verde meu.

Planto verde sem olhar,
planto dor,
planto amar.









A MÚSICA QUE ESVAZIA OS PULMÕES


- Com uma flauta doce e uma produção simples entoo essa canção ao que chamo de natureza. - Numa trilha escura, apática, úmida e visivelmente silenciosa irei tentar - com meus pobres pulmões - adorar a única coisa que me conecta com o que ainda existe de precioso na contemporaneidade e também de mais antigo que conheço. - Enquanto ela existir, matas úmidas e escuras; trilhas cegas e capins dançantes; florestas tortas e beija-flor molhados.

- Enquanto sejam campos ou simplesmente o verde achatado, Pachamama vai estar ali. - Que o seu espírito, mesmo adormecido, não caia na angustia de perceber a podridão que o ser humano está tornando na Terra. - Que ainda viva nosso maior bem comum: a Terra.

- Que ao cantar novamente, consiga acalmar a inevitável desgraça que há de vir. - Não, não vão mais restar palavras, frases, cartaz ou pingos de chuva que conseguirão suprir o buraco enorme deixado pelo (des)seres humano no planeta Terra. - (com desprezo) Então, eu fogo uma praga: que a fúria dEla consuma cada ser humano egoísta o suficiente e longe de uma consciência de vida.

- Pelo envenenamento de suas próprias vidas, sejam consumidos por desgraças cobertas de risos. - Não peço desculpas e rogo outra praga se tivesse certeza que ainda teria jeito. - Só me resta cantar novamente - coeso ou não - em um ato poético: sobre o solo vegetar. - Esse seria o meu morrer com a natureza. - Meu último suspiro seria um inspiro.















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